Eu adorava sentar com meus amigos, que eram poucos mas eram reais, e me sujar de terra, rir, trocar idéias, olhar olho no olho, brincar de pião, ioiô, picula, esconde-esconde, tomar banho no rio, fazer trilhas de bicicleta, cair, me machucar, pedir ajuda, ajudar... abraçar e ser abraçado. Eu adorava um abraço sincero.
Eu adorava sentir cada momento como se fosse único, convivendo com pessoas, com irmãos, sem preocupação de quem era mais pobre, mais feio, mais preto, mais gay, mais gordo, mais branquelo, mais burro... nada importava a não ser sermos amigos, amigos de verdade.
Eu adorava sentar nas pedras, nos barrancos, nos morros e apreciar o sol nascer, o sol se pôr, a luz surgir ou sumir no horizonte e desenhando o perfil daqueles que amávamos como irmãos, capazes de dar a vida um pelo outro por amor nobre e puro sem chips, sem tela, sem máscaras... sem malícias, apenas amor de criança.
Eu adoraria que minha filha pudesse saber o que é viver de verdade sem este mundo mecanizado, sem esta necessidade de poder, de superioridade, de preconceito, onde o mais forte é o mais importante, onde os amigos se falam por telas e a individualidade reina sem espaço para a compaixão, onde o mundo se resume a quatro paredes frias.
Gostaria que ela pudesse ter a infância que eu tive sentindo o cheiro, o sabor, o calor da vida correndo em nossas veias através do respeito e do amor mútuo sem malícias, sem ganâncias, sem ambições, mas apenas vivendo cada momento como se fosse o último. - Wagner Miranda